Braga Ciclável não reconhece no ACP e na FIA competências para analisar Rede Ciclável

Braga Ciclável @ Braga Ciclável

Publicado em 17/06/2025 às 22:03

Temas: Comunicado ACP Automóvel Clube de Portugal Bicicleta Bicification Federação Internacional de Automóvel FIA Lisboa Município Município de Braga Reactivity Rede Ciclável


O ACP – Automóvel Clube de Portugal, associação nacional dedicada ao setor automóvel, e a FIA – Federation Internationale de l’Automobile, são duas entidades de renome no sector do automóvel, sem qualquer tipo de competência ou sensibilidade para a mobilidade ativa. O ACP e a FIA têm, aliás, tido posições públicas contrárias à promoção do uso da bicicleta, muitas vezes refutadas pelas entidades nacionais dedicadas ao setor da mobilidade pedonal e em bicicleta, como a FPCUB – Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores da Bicicleta e a MUBi – Associação Pela Mobilidade Urbana em Bicicleta. Pode-se até dizer que há um claro conflito de interesses em ter o ACP e a FIA a analisarem a rede ciclável.

Quando o Município coloca entidades como o Automóvel Clube de Portugal e a Federação Internacional de Automóvel a analisar a sua “rede ciclável”, é como pôr a raposa na capoeira dizendo que é para proteger as galinhas.

É incompreensível que o Município não chame à análise da rede os membros com conhecimento na área da mobilidade em bicicleta do Conselho Consultivo para a Mobilidade de Braga, nem as entidades nacionais com conhecimento na área.

Não se consegue entender como é que se vai analisar uma “rede” ciclável que, pela sua dimensão e dispersão, não tem efeito de rede, uma “rede” que ainda não atingiu as metas propostas de 76 km para 2025, que ainda não está conectada, e se ignora a rede de estradas por onde, à falta de uma rede viária ciclável, é diariamente utilizada a bicicleta. De notar ainda que a proposta de PDM é a de retirar esta rede ciclável e manter apenas o que existe atualmente, que não está conectado.

Não se entende também como dizem que vão usar dados do Bicification e do Reactivity, que não são levantamentos rigorosos e suficientemente abrangentes para serem uma radiografia dos percursos em que as pessoas utilizam a bicicleta. Basta observar presencialmente a utilização das ruas de Braga, ou analisar os dados facilmente consultáveis do Strava – a que o Município tem acesso, mas decide ignorar.

A par disso, estes mapas mostram-nos por onde as pessoas andam, não por onde as pessoas querem andar, mas têm medo. E está demonstrado que a maior parte das pessoas que usa a bicicleta em Braga muitas vezes não opta pelo percurso mais rápido ou direto por medo – por falta de condições de segurança na rede viária.

A Câmara Municipal de Lisboa contratou uma consultora de renome internacional, a Copenhagenize, para fazer a avaliação da rede ciclável do Município de Lisboa, gerando um relatório rigoroso, tendo em conta as boas práticas internacionais e com projetos de melhoria em vários níveis da rede, bem como a criação de “missing links” e ciclovias novas. De notar que Lisboa já tem uma rede de ciclovias que prevê duplicar nesse relatório. Braga não tem 10 km de ciclovias, e entrega uma análise a entidades que apenas têm em vista a promoção do automóvel, dizendo que vai requalificar a rede ciclável.

Planos para Rede Ciclável de Braga

Qual rede ciclável é que vai ser requalificada? Que ciclovias? A de Lamaçães? A da Avenida da Liberdade?

A Braga Ciclável continua, como sempre, disponível para reunir, para avaliar, para melhorar a rede ciclável, a acessibilidade para quem se desloca a pé ou de cadeira de rodas e para criar condições para o transporte público ser eficiente e eficaz. Temos o conhecimento, trabalho de mais de uma década e os dados. O Município tem optado por fechar a porta e não responder.

É o que ocorre com o pedido de apoio que está no Município desde julho de 2024, com o pedido de redução da sinistralidade através da redução e controlo das velocidades nas vias, com o pedido de parecer, com a perseguição perpetrada às bicicletas na zona pedonal – sem fundamento legal. Infelizmente, este Município tem ignorado e ostracizado a única ONGA – Organização Não Governamental de Ambiente, local do Concelho, e a que mais tem crescido em associados e atividades.

A Braga Ciclável continuará sempre disponível para trabalhar pelo nosso Concelho na promoção de melhores condições para a mobilidade a pé, de bicicleta e em transportes públicos.

 

Braga Ciclável reuniu-se com a CDU

Braga Ciclável @ Braga Ciclável

Publicado em 13/06/2025 às 21:26

Temas: Notícias Avenida António Macedo Bicicleta CDU eleições eleições 2025 Filipe Gomes Gabriel Castro João Baptista Manifesto 40-24 Proposta de Mobilidade Sustentável Rafael Remondes reunião


A Associação Braga Ciclável reuniu-se no passado dia 11 de junho com a candidatura autárquica da CDU à câmara municipal de Braga para apresentar o documento Manifesto 40-24, que contém 40 propostas da associação a serem implementadas nos próximos 24 meses. Com este manifesto, a associação pretende desafiar as candidaturas autárquicas a integrarem estas medidas nos respectivos programas eleitorais.

Durante a reunião, foi possível não só discutir as várias propostas do documento com os responsáveis da CDU, como também abordar as dificuldades de mobilidade que afetam os bracarenses, nomeadamente a falta de alternativas ao automóvel para as deslocações urbanas e interconcelhias.

A CDU manifestou abertura em considerar as medidas inscritas no manifesto, concordando com várias das propostas. Foi ainda discutida a necessidade de requalificar avenidas como a Avenida António Macedo, transformando-as em verdadeiras avenidas urbanas e não apenas variantes rodoviárias.

Estiveram presentes na reunião Rafael Remondes e José Barbosa, em representação da Braga Ciclável, e João Baptista, Filipe Gomes e Gabriel Castro, pela CDU.

 

Festivais de Verão em Bicicleta

Cristina Miranda da Cruz @ Braga Ciclável

Publicado em 7/06/2025 às 7:00

Temas: Opinião Bicicleta Cicloturismo Cristina Cruz Cristina Miranda Cruz festivais verão


Com a chegada do Verão, chega o calor, a praia, as férias e os festivais de Verão. Os dias ficam maiores e as noites mais quentes, a vontade de sair de casa e fazer atividades ao ar livre aumenta.

E se, neste Verão, deixasses o carro em casa e fosses a pedalar com um grupo de desconhecidos em direção aos teus festivais de verão preferidos?

O conceito não é novo e desenvolve-se há vários anos em Portugal. Aproveita o melhor de dois mundos, unindo a paixão pelo cicloturismo à música e à dança. Originalmente promovido pela Cicloficina dos Anjos, em direção ao festival Andanças, o Pedalanças tem tido crescente sucesso, tendo-se estendido o conceito também ao festival Tradidanças.

O objetivo primordial é a promoção de uma forma de deslocação ativa, ecológica e sustentável, a custo zero e sem qualquer de emissão carbónica. Os danos colaterais são pessoas de todo o país a conhecerem-se e a viajarem em conjunto em direção a estes festivais.

A viagem desenrola-se, geralmente, ao longo de 3 ou 4 dias, tendo ponto de partida em Lisboa no caso do Andanças (em direção a Campinho no Alentejo) e no Porto no caso do Tradidanças (em direção a Carvalhais na beira Alta).

São sugeridos itinerários considerados mais seguros, idealmente ao longo ecovias/ciclovias. Habitualmente, os percursos escolhidos primam pela proximidade com a Natureza e pelo respeito pela cultura e tradições das localidades visitadas. Ao longo desses percursos, são sugeridos pontos de encontro para realização de pausas/convívio e reposição de energias. Ao final do dia, são organizados jantares de grupo para maior camaradagem e partilha de experiências e são facilitados locais de pernoita seguros (habitualmente gratuitos ou com uma contribuição simbólica).

O ritmo é acessível a todos os participantes, sendo inclusivo para todas as faixas etárias e a todo o tipo de preparação física. De facto, verifica-se a criação de um enorme espírito de comunidade e entre-ajuda entre todos os participantes, sob o lema de nunca deixar ninguém para trás. É fomentada ainda a partilha de ferramentas/conhecimentos para resolução de pequenos problemas que possam surgir ao longo da viagem.

O resultado é um grupo de pessoas mais confiantes na sua autonomia em bicicleta, quer em termos de capacidade física, quer em termos de resolução de imprevistos e avarias.

Não é raro que os participantes transponham posteriormente essa descoberta de autonomia para o planeamento de novas viagens em bicicleta com novos destinos, de forma espontânea, individualmente ou em grupo. E a maior prova de sucesso é mesmo que a generalidade dos participantes, volta no ano seguinte e traz consigo um amigo também.

 

BRM 200 Serra da Freita, o primeiro Brevet Randonneurs Portugal com saída e chegada à Cidade Invicta.

paulofski @ na bicicleta

Publicado em 6/06/2025 às 13:58

Temas: marcas do selim Alan amigo Pawel Arouca bicicleta boas pedaladas brevet BRM 200 Castelo de Paiva cicloturismo devaneios a pedais dos malucos das biclas voadoras esta malta tem cá um pedal!... estrada Feira fotografia fotopedaladas Furadouro Gorka Gralheira longas pedaladas Miranda Mizarela montanhas de quilómetros Montanhas Mágicas motivação outras coisas Ovar pelas ruas do Porto Porto randonneur randonneurs portugal roda de amigos Serra da Freita Subida mais longa Zé Ferreira

A apenas vinte minutos pedalados de casa para o local de depart, poderia dar a entender que os preparativos para nova rodada “randonneira” fossem mais relaxados! Só que não. Se no planeamento deste brevet e posterior averiguação in loco do percurso participei com todo o gosto, não ia faltar ao apoio com os organizadores Manuel Miranda e José Ferreira no bike check da saída. Assim, lá tive de saltar da cama pelas cinco da matina, tal e qual como se fosse viajar para Marinhas, o local habitual de saída do brevets para norte!

O prato principal é contagiar os ciclistas com a magia da Freita, mas para chegar ao ponto alto do dia foi preciso encher alguns chouriços. Os primeiros quilómetros serão mais tranquilos, cumprindo o plano mais plano. Gradualmente o ondulante perfil interior orientará os ciclistas rumo ao objectivo. Com a serra na linha do horizonte, os ciclistas vão sentir a progressiva ascensão pelo lado de Arões. Vai, quem sabe, pausar em Mira Freita. Irá resistir ao calor na escalada para o planalto. Poderá interrogar-se, “o que é isso das Pedras Parideias!?”. Não escapará à contemplação da cascata da Frecha da Mizarela… no fundo, irá maravilhar-se com locais de rara beleza e pura dureza.

Seis e meia da matina, aos poucos, os participantes foram chegando, juntando-se no parque de estacionamento da Portgás. Conversas de circunstância, revisão das regras à indumentária e às máquinas, finda a reunião preparatória, vinte e nove randonneurs e uma randonneuse perfilaram-se para a foto da praxe. Sete e meia, lentamente fomos descendo a Estrada da Circunvalação rumo ao Douro.

Passado o tabuleiro inferior da Ponte Luiz I, um bando de coletes florescentes espantava turistas errantes, colorindo a estrada ao longo da marginal de Gaia. A neblina proveniente do oceano entrava na bacia do Douro, envolvendo o inconfundível arco da Ponte da Arrábida. À passagem pela piscatória Afurada a temperatura desce ligeiramente. O ex-libris de Miramar, a Capela do Senhor da Pedra, não figurou nos álbuns fotográficos dos passantes porque, simplesmente, não se conseguia mirar nada!

Os cinquenta quilómetros iniciais são rodados em terreno plano, ao longo das ciclovias à beira-mar plantadas. Após Espinho fez-se a rodagem num troço sem trânsito, paralelo à linha de comboio, até que os ciclistas se embrenharem na ondulante e verdejante estrada florestal, de Cortegaça ao Furadouro, onde o Zé Ferreira os aguardava, munido de um mini carimbo para registar a passagem no primeiro posto de controlo, no Café Rota do Mar onde também estava assegurado o abastecimento calórico.

Com a viragem para Nascente, paulatinamente a névoa da manhã se foi e o sol voltou a dar um ar de sua graça. Com a passagem pelo centro de Ovar, da pacifica pedalada que houve até ali seria o contraste. Face ao crescente volume de trafico que iriam enfrentar, soariam alarmes com redobrados cuidados entre o pelotão.

A estrada ainda é plana, por agora, mas em breve irá dará lugar a alguns topos mais elevados. Outro ponto de indiscutível interesse foi a passagem por Santa Maria da Feira, estrategicamente incluída no roteiro. Depois de apontados os telemóveis ao imponente Castelo da Feira, os ciclistas tiveram de se amanhar por um massacrante piso paralelepípedo. Vá lá que era a descer… até ver!

A abordagem para o interior obrigou à passagem por alguns centros urbanos, prendendo toda a atenção, tanto na orientação, cautelas redobradas no atravessamento de estradas mais movimentadas, até que progressivamente as paisagens rurais com caminhos mais calmos começam a ser mais frequentes. Ali, facilmente somos testemunhas das rotinas diárias de um modo de vida mais tranquilo, onde um audível “Bom Dia” nos sai naturalmente, ao qual as pessoas devolvem o gesto com simpatia.

Cerca de dez graus acima do começo da jornada, agora que a leve ascensão na estrada nos impele para a frente, clicando nas manetes à procura de uma engrenagem mais leve e, em seguida, esgotar as possibilidades disponíveis no pedaleiro maior, uma série de colinas se intermedeiam, antecipando no horizonte o que aí vem. A vista da serra revela-nos a sua grandeza e ainda estamos a aquecer.

foto: Pawel

Na berma da estrada, um senhor idoso colocava garrafões de plástico na mala do carro. De tão ressoados que estavam os garrafões, dava a ideia que a água era fresquíssima, e indaguei: “Caro senhor, essa água vem de onde? Não vejo aqui nenhum fontanário!”. Outro homem surge do meio do mato, carregando mais dois garrafões cheios. “Ali ao fundo, e é água muito boa, podem estar seguros, mas tenham cuidado que o chão escorrega”. Fazendo uma pausa para um longo gole de água gelada, saimos dali com os bidons cheiinhos e prosseguimos a subida à conversa.

No horizonte, saídos debaixo da sombreada copa das arvores, as cores da serra e as aldeias sobressaiam no panorama. Já a subida ia a meio e só agora passávamos pelo primeiro carro desde há largos minutos. Na rota da dita “Subida mais longa”, ao quilómetro 13, alcançamos Mira Freita e a hipótese de uma paragem, não porque estivéssemos cansados, mas porque sabia d’antemão que ali haviam boas sandes de presunto e frescas cervejinhas para quem quisesse antecipar o almoço.

Sábado foi um dia em que o calor apertou e bem. Péssima hora para atacar a Serra da Freita, pensámos, mas disso a montanha não tem culpa. Nós é que quisemos estar ali, a sofrer, a derreter sob o abrasador sol do meio-dia, mas não nos podíamos queixar. O dia estava fantástico e dava para ver perfeitamente toda a paisagem que nos rodeia.

Retoma-se a subida. A estrada diante de mim é cada vez mais severa. Numa curva com vistas largas, páro para fotografar e desfrutar da agradável panorâmica. Sorvo da minha garrafa de água, procuro me refrescar aproveitando uma brisa leve, mas os níveis do mercúrio estão bem acima dos 35 graus! Ao longe, a visão do radar meteorológico relembra-me que tenho mais quilómetros de subida pela frente, e eu estou a contar com eles.

O ritmo é lento, também muito por culpa do panorama paisagístico que me envolve de sobremaneira. O suor escorre pelo meu rosto e não resisto a mais um momento de pé no chão para outra fotografia, captando alguns dos meus companheiros que me perseguem. Aqui pode-se desfrutar de uma paisagem que quase atinge o infinito. Para onde quer que se olhe o momento é de silencio, só nós, as nossas bicicletas e a fantástica paisagem. Agora sente-se uma ligeira brida de vento, mas que não é capaz de pôr as eólicas a girar.

O recorte da torre do radar meteorológico indicava que estamos quase no ponto mais alto do Maciço da Gralheira! Com ânimo redobrado, transpomos a barreira dos mil metros de altitude e alcançamos o planalto da Serra da Freita. Montes matizados do amarelo e do lilás, da carqueja e da urze, a natureza é surpreendente. Extasia-nos com maravilhas invulgares, com caminhos ancestrais, geossítios e fenómenos geológicos que originaram o Arouca Geopark. Como estas estradas são lisas e tranquilas, quase sem trânsito a atrapalhar a calmaria, e alguns montículos de bosta no meio do alcatrão revelam pistas que as vacas arouquesas pastam por ali.

Ponto obrigatório do roteiro, o miradouro da Frecha da Mizarela compensa todo o esforço que ficou para trás, para ali chegar. As chuvadas deste inverno engrossaram o rio Caima, que nasce no planalto da Freita, e ampliaram a arrebatadora beleza da cascata mais alta de Portugal Continental, ao despenhar-se a 60 metros de altura um dos locais mais emblemáticos da serra. Mais umas quantas fotografias e um pouco de conversa sobre o que tínhamos visto até ali, foi com um dos principais objectivos atingidos que nos colocamos em marcha via Merujal.

O segundo posto de controlo, na Mercearia da Montanha, prometia-nos algum descanso e reforço alimentar. Pelo tempo que demorou a chegar à mesa, nem foi necessário esperar que o caldo verde arrefecesse. Meia-hora depois e estávamos em marcha, novamente em subida, num alcatrão bem lisinho. Se a praia fluvial de Albergaria da Serra seria uma boa desculpa, alguns randonneiros acharam que sim, o passeio no parque de diversões tinha de prosseguir.

Zé Ferreira não participar para registar a nossa passagem pelos postos de controlo

Juntamente com novos companheiros de roteiro, a estrada em excelente piso volta a empinar, refletindo as curvas sob a luz solar. Para lá da zona do parque de campismo. fora da protecção do arvoredo, somos atingidos pelo calor do ar e cozidos na fornalha do sol. Não há ponta de vento.

Uma pausa no relato para falar da bicicleta reclinada do Pedro! Subir pendentes consideráveis numa chaise long com pedais não é nada fácil. Ao contrario da capacidade que as recumbentes têm em atingir velocidades consideráveis no terreno plano, é de louvar o esforço quando a estrada se inclina à frente do ciclista. Tendo em conta a posição diferente das bicicletas convencionais, uma grande desvantagem das bicicletas reclinadas é a redução da potência devido à menor capacidade de usar as pernas contra o quadro. Por outro lado, pensava eu, não é tão simples abordar as descidas. Revela-se problemático o uso de travões convencionais em rodas de carbono. Pura e simplesmente o Pedro derreteu a pista de travagem no aro da roda traseira enquanto travava na abrupta descida para Arouca.

foto Pawel

Chegamos a Arouca cansados do rude alcatrão e de tanto tempo a pressionar as manetes de travão. Ao vermos algum pessoal refastelado numa esplanada, que também assistia as incidências da derradeira etapa do Giro de Itália, paramos para um cafezinho e mais qualquer coisa. Passados uns minutos pusemo-nos novamente em marcha, para uns quilómetros mais à frente calcarmos a estrada rumo a Castelo de Paiva.

A N224 é uma estrada bastante prazerosa, com um perfil e envolvente muito agradáveis, curvas sensuais e absolutamente nenhum trânsito. Para além de não ter sido ultrapassado por um carro, o único veiculo por assim de dizer com que me cruzei em longos quilómetros foi uma motorizada que descia de motor desligado.  

Embalados pela benesse gravitacional, subitamente calcamos os paralelos à entrada de Castelo de Paiva para nos determos na confeitaria indicada, tanto para carimbar o cartãozinho, como para voltar a hidratar e saborear um gelado… ou dois! Estávamos a um quarto de hora das 16h, só que o relógio não parava e ainda havia um quarto de percurso por pedalar. De novo com o depósito cheio, depressa estávamos de volta ao selim para mais duas horas de pedalada. Continuou-se a descer.

Com a alma revigorada já tínhamos o Rio Douro e o vento pela frente. O percurso pela N108 até ao Porto é sobejamente conhecido. Não sei bem porquê, desta vez os meus diabretes não apareceram para me atazanar, aparentemente eu estava cheio de pica. Entusiasmei-me e, sem me aperceber, fugi dos meus companheiros de pedalada. Entretanto, “apanhei” o Rui e o Carlos que “conduzi” até às portas do Porto.  Praticamente com o brevet concluído, deixei-os ir e sentei-me no trono de pedra à entrada do Parque Oriental, à esperei do pessoal para percorrer os derradeiros quatro quilómetros em conjunto sob a frescura ao longo do Rio Tinto.

Que belo dia para pedalar. Foi de facto um fantástico e inesquecível Brevet, com um grande companheirismo e, como habitualmente, mais uma irrepreensível organização dos Randonneur Portugal, nas pessoas do Manuel Miranda e José Ferreira, a quem muito louvamos o esforço e dedicação à causa. Um abraço a todos que participaram e comigo conviveram, aos meus amigos Pawel, Nelson, Jorge e em especial ao Alan, que se despediu, por agora, pois irá brevemente pedalar, entre outras coisas, para as estradas onde se circula à esquerda, para Inglaterra.

Pawel, Alan e moi méme

Até Breve(t), embora me pareça que pelo calendário de 2025 não poderei participar em mais algum evento randonneiro.

 

Sinal dos tempos

João Forte @ Braga Ciclável

Publicado em 24/05/2025 às 7:00

Temas: Opinião desporto galeria João Forte João Paulo Forte proibição sombra tempo tempo passa


Braga é uma cidade onde ainda se vão vendo prédios construídos com uma galeria que dá para nos salvaguardarmos da chuva ou do calor enquanto vamos a caminhar para o trabalho, para as compras ou simplesmente numa bela caminhada. É, mesmo que não tenhamos a consciência disso, uma boa medida urbanística para salvaguardar os peões que usam o espaço urbano para se mover da forma mais confortável possível. E também de aproximar clientes às lojas de uma forma mais sublime. Estando a chover torrencialmente estas galerias são um bom refúgio ou simplesmente uma boa forma andar a salvo da chuva durante parte ou partes do trajecto. Ou no Verão, com o calor a apertar, estas galerias representam espaços com sombra que podemos aproveitar para usar ao ir do lugar X ao lugar Y. Por vezes, e nestas mesmas galerias, são colocados avisos ou mesmo sinais a alertar que é proibido fazer desporto naquelas galerias, como se alguma vez os desportistas fizessem destas galerias o seu local de treino. Por vezes os avisos ou sinais têm o símbolo de uns patins em linha, bicicleta, skate ou simplesmente “É proibido praticar desporto nas galerias”.

Apesar de, apenas em parte, compreender o intuito, acaba por ser curiosa esta postura de proibição de actividade desportiva, já que o que seria expectável seria apenas uma mensagem pedagógica sobre o bom uso destas galerias e um apelo ao civismo.

Foi com algum espanto que há algumas semanas me deparei com a imagem que acompanha este comentário, em Tadim, num prédio com uma galeria frontal que nem sequer é apropriado para a passagem de bicicletas. Apenas para quem eventualmente traga a sua bicicleta de dentro de casa, restando saber se aquele sinal significa que ao sair da porta se tem de levar a bicicleta às costas.

Diria talvez que este sinal é um sinal dos tempos, mas não no bom sentido. Tempos onde quem tem e usa bicicleta é prejudicado pelo preconceito de terceiros, que não concebem que a bicicleta é uma de várias opções de mobilidade. Curiosamente, e na frente e lateral deste mesmo prédio, vi vários veículos estacionados em cima do passeio, sem que houvesse por ali um sinal a proibir este tipo de comportamentos anti-sociais. Isto, claro, mesmo tendo em conta que o Código de Estrada proíbe o estacionamento em cima dos passeios e que não é suposto sequer que esteja ali um sinal a proibir o estacionamento em cima do passeio. Falo disto desta forma porque é uma dicotomia curiosa, onde quem perde é sempre a bicicleta e o peão e quem “ganha” é sempre o carro.

As cidades, vilas e aldeias precisam de ser amigas dos peões e das bicicletas, não dos carros. Já todos vimos que esta inimizade pelos peões e bicicletas e amizade pelos carros nos tornou reféns dos carros com tudo o que de negativo isso trouxe à nossa vida, a começar pela qualidade de vida.

 

“Cuidado com o carro!”, diz o pai, que estacionou em cima do passeio.

Rita Rodrigues @ Braga Ciclável

Publicado em 10/05/2025 às 7:08

Temas: Opinião Bicicleta carro cicloexpresso escolas just streets kidical mass passeio pedibus rita rodrigues rue scolaire


Quando pensamos na entrada principal de uma escola, automaticamente imaginamos uma zona confusa, cheia de carros, carros esses que estão muitas vezes mal-estacionados, em cima do passeio, em segunda fila, e com os pais a dizer repetidamente “cuidado com os carros!”.

Agora tentemos imaginar um cenário em que a rua principal de uma escola não tem trânsito, onde existe espaço para os pais conviverem e para as crianças brincarem, um espaço seguro para os mais novos se deslocarem de casa para a escola, e vice-versa, um espaço onde se proporciona um ambiente seguro, pouco poluído e onde se promove a autonomia das crianças.

Será uma utopia pensarmos neste segundo cenário para as escolas em Braga?

Não seremos nós, pais, os grandes responsáveis por esta falta de segurança em frente às escolas, escolas essas em que os nossos filhos estão?

Não seremos nós, pais, a dar um péssimo exemplo de cidadania e de respeito pelos outros, ao estacionarmos em segunda fila, em cima dos passeios, na faixa dedicada aos autocarros, ou até mesmo em cima das passadeiras?

Com estes comportamentos, os nossos filhos olham para o nosso exemplo, e certamente, quando forem adultos, vão achar estes comportamentos “normais” e irão repeti-los, dizendo que “são apenas 5 minutos”.

Estaremos nós, pais, dispostos a abdicar do nosso comodismo, em prol de zonas escolares mais seguras e menos poluídas?

Em algumas cidades europeias este cenário já é uma possibilidade. Em Paris já existem 160 “rue scolaire”, que são ruas em frente ou nas imediações de escolas onde a circulação de carros é proibida ou fortemente limitada, normalmente nos horários de entrada e saída dos alunos. Para controlar esses acessos, existem barreiras físicas, sinalização clara (avisos luminosos ou placas específicas com os horários de proibição), câmaras de videovigilância, e controlo por agentes da polícia.

Em Barcelona esta limitação automóvel envolve também melhorias urbanas como bancos, vegetação e sinalização lúdica. Cidades como Bruxelas, Amesterdão e Roma também têm projetos semelhantes.

Em Portugal ainda estamos muito aquém, longe de serem atingidas metas tão ambiciosas. Com alguns projetos desenvolvidos na nossa cidade percebemos que existe vontade em criar mais condições para as nossas crianças, mas falta mais empenho e desejo real que estas coisas aconteçam o quanto antes.

Destaco alguns projetos que existem na cidade de Braga: PEDIBUS, CICLOEXPRESSO, KIDICAL MASS, JUST STREETS.

No PEDIBUS as crianças vão em “comboios” humanos para a escola, guiadas por monitores, em trajetos e paragens previamente definidas, como se fosse um autocarro.

O CICLO EXPRESSO segue a mesma lógica, mas as crianças deslocam-se para a escola de bicicleta.

O KIDICAL MASS é um projeto internacional, mas que todos os anos se realiza em Braga, com um percurso de bicicleta onde se pretende reivindicar mais condições de segurança para as crianças andarem na rua. É já no dia 10 de maio de 2025 que temos esta maravilhosa iniciativa a percorrer a cidade de Braga.

O projeto “JUST STRETS – Justiça na mobilidade para todos”, visa tornar as ruas mais acolhedoras e seguras, especialmente para as crianças. Este projeto-piloto pretende transformar as ruas em espaços públicos mais agradáveis, reduzindo o tráfego automóvel e promovendo a mobilidade ativa.

Todos nós queremos mais segurança para as nossas crianças, para os nossos filhos, todos queremos que eles brinquem na rua, tal como nós brincámos.

Vamos ser nós os agentes da mudança?

 

Pedalar para a Autonomia…

Rafael Sousa @ Braga Ciclável

Publicado em 26/04/2025 às 7:00

Temas: Opinião autonomia Bicicleta Ciclovias crianças dependência idosos pedalar Rafael Sousa Sinistralidade Sociedade


À capacidade de tomar decisões, de agir livremente e de forma racional, sem imposições externas ou limitações do meio que nos envolve, chamamos habitualmente “autonomia”.

Esta capacidade, que aprendemos na infância, fica muitas vezes comprometida em idades mais avançadas, pelos mais variados motivos, entre os quais, a dificuldade de mobilidade no espaço urbano.

A forma como as cidades estão organizadas, determina e condiciona em muito a nossa autonomia, no que concerne à mobilidade, sendo que, serão sempre os grupos etários mais vulneráveis, os mais prejudicados nesta problemática.

Há muitos anos, que a bicicleta constitui uma importante forma de locomoção, que pode ser utilizada de forma universal, por diversas faixas etárias, desde que existam para tal, estruturas seguras. Por toda a Europa, muitos são os bons exemplos da utilização da bicicleta no espaço urbano, tanto por crianças nas suas deslocações até à escola ou espaços de lazer, como por idosos que encontram nos velocípedes, uma importante ferramenta para a manutenção da autonomia, do envelhecimento ativo e da inclusão social.

Criar redes cicláveis bem planeadas e seguras, é também, uma “importante” forma de promover o convívio intergeracional, o sentido comunitário e a humanização das cidades.

Em Braga, a realidade ainda é muito improfícua para quem pretende utilizar a bicicleta como forma de se deslocar na cidade, sendo a segurança o principal fator dissuasor. Urge, portanto, uma visão estrutural no planeamento da mobilidade na nossa cidade, que vise proteger a autonomia dos grupos etários mais vulneráveis, com a construção de uma rede ciclável segura e que cubra uma área muito mais abrangente do território urbano.

A realidade descrita, e a limitação de autonomia que acarreta em muitos cidadãos, obriga ao recurso excessivo do automóvel, sobrecarregando as vias rodoviárias, tal como é diariamente visível em Braga. Mais de 70% das deslocações na cidade são feitas de carro, refletindo uma infraestrutura urbana planeada para favorecer o automóvel em detrimento de modos de transporte mais sustentáveis e inclusivos. Esta dependência do carro não só limita a autonomia de crianças, idosos e pessoas com mobilidade reduzida, como também contribui para o aumento do tráfego, da sinistralidade rodoviária e do stress urbano.

A saturação das estradas e o consequente aumento de acidentes, especialmente em zonas centrais, junto a escolas e locais frequentados por grupos vulneráveis, são sintomas de uma cidade que ainda não conseguiu proporcionar alternativas seguras e eficientes de mobilidade ativa, como redes cicláveis e transportes públicos acessíveis. Assim, a falta de autonomia de parte da população acaba por transferir o “peso” logístico e emocional para as famílias e para a sociedade, perpetuando um ciclo de dependência do automóvel.

Que bom seria, ver crianças e idosos, a partilhar o mesmo caminho, rumo a uma sociedade mais justa e integradora de todos…

 

Uma ciclovia até ao campo

Inês Capitão @ Braga Ciclável

Publicado em 12/04/2025 às 8:00

Temas: Opinião Alemanha bairros Bélgica Bicicleta Bosch campo canção cantar casa de campo ciclovia Ciclovias Ecovia Elis Regina escolas Inês Capitão montanha natureza periferia Rio Cávado


Há uns anos, Elis Regina cantava: “Eu quero uma casa de campo”. Eu, não menos modesta, quero uma ciclovia que me leve até ao campo.

Esta é a analogia que vos trago hoje. Bem sei que, antes de podermos ter uma casa de campo, a prioridade é termos uma (boa) casa, apenas. A ciclovia que nos serve atualmente tem ainda muito para melhorar, mas vou aproveitar este espaço para imaginar e, quiçá, adivinhar um possível futuro.

De tantos caminhos possíveis, tenho a sorte de ter uma ciclovia que me leva quase até ao meu local de trabalho, tornando a minha viagem diária uma experiência revigorante de pura liberdade. Contudo, ao chegar o fim de semana, a minha bicicleta fica arrumada. Embora eu reconheça que sou uma sortuda por ter essa ciclovia que conecta minha casa ao trabalho, sei que a infraestrutura ciclável na cidade ainda é bastante deficitária. Não há opções que me permitam explorar a periferia da cidade ou dar um passeio até ao rio. Precisamos de ciclovias que nos permitam não apenas ir de casa ao trabalho, mas também explorar e desfrutar do que a cidade e a natureza têm para oferecer.

Apesar de terem sido apenas alguns meses, tive o privilégio de viver na Bélgica e na Alemanha, onde a bicicleta é um meio de transporte amplamente utilizado. Em ambos os países, contava com ciclovias que me acompanhavam no quotidiano e ecovias que me levavam aonde quisesse. Lá, o que me limitava era a fadiga muscular. Aqui, a luta é diferente: é contra a falta de infraestrutura, ou a ausência de um ‘mapa’ que me leve do centro da cidade até ao campo, à montanha ou ao rio.

Quem me conhece sabe que, para mim, ir a pé, de bicicleta ou a correr são as opções que mais utilizo. O meu GPS já se rendeu a essa realidade e, por defeito, coloca-se em modo ‘a pé’. É quase como se o algoritmo dissesse: “Já te conheço, Inês, sei que não vais de carro!” Para ir à minha terra, Póvoa de Varzim, recorro ao carro, mas sonho em conseguir ir ter com os meus pais sempre em plena ciclovia.

A ecovia do Cávado planeia uma ligação de Esposende até Amares. As infraestruturas que estão a ser criadas junto ao rio Cávado são de excelência, mas como servirão os habitantes de Braga? Precisamos de uma rede que conecte não apenas os pontos turísticos, mas também os bairros, as escolas e a periferia. Uma cidade ciclável é uma cidade mais feliz, mais unida e, acima de tudo, mais saudável.

Portanto, deixo aqui o meu apelo: que possamos sonhar juntos com uma Braga mais ciclável, onde a ciclovia que me leva até ao campo não seja apenas um desejo, mas uma realidade. E quem sabe, um dia, eu possa cantar, assim como Elis Regina, que quero uma casa de campo… e uma ciclovia que me leve até lá!

 

“olha, dei a volta ao conta-quilómetros!”

paulofski @ na bicicleta

Publicado em 4/04/2025 às 14:24

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Já antes pedalava diariamente, em percursos urbanos para e do trabalho. Já antes alargava os meus passeios de fim de semana. Já antes havia participado em Brevet´s dos Randonneur Mondial, mas, como entretanto vim a saber: “se não está no Strava, não aconteceu!”

Era uma manhã de um sábado cendrado pelo nevoeiro. De olhos turvos, ainda num estado semiconsciente e pré-cafeinado, abri o Strava, e, sem saber bem se a geringonça nova iria cumprir o prometido, dei inicio a uma boa aventura. Diz que o tempo voa, mas estes dez anos, desde a minha primeira pedalada registada no Strava, parecem ter sido supersónicos!

Não levo o Strava muito a sério. Não sou muito adepto dos desafios, nunca usei um medidor de potência e muito menos um monitor de frequência cardíaca para me dizer que o meu coração ainda bate. Continuo a ser um utilizador banal, resistindo aos constantes apelos de subscrição, no entanto tenho de agradecer a esta inigualável plataforma toda a incrível tecnologia como repositório das minhas actividades cicláveis (e algumas pedonaveis!).

Voltando aos dias inebriantes da primavera de 2015. Tudo mudou quando o Pelotão do Arrasto, um grupo de amigos que jogava cartas ao longo da estrada N108, partilhava nas publicações do Instagram: “Oh pá, já viste os nossos PR´s desta manhã?” Eu não via. Primeiro nem sabia bem o que ere um “PêéRre”. Depois não tinha um gêpêésse ou mesmo um telefone esperto capaz de correr a “App”. O Strava não tinha importância, pelo menos não tinha para mim até me decidir comprar um telemóvel de jeito e fazer o meu primeiro “upload”, numa reedição da clássica bicinigração a Fátima.

Inspirado pelos meus amigos, isso me fez conquistar “PêéRres” e coisas novas também. Pronto, aos poucos também fiquei obcecado com aquilo. Persegui os melhores tempos pessoais, pedalei distâncias cada vez maiores e escalei subidas para mim inimagináveis. Agora, ao longo do tempo, era capaz de quantificar e comparar dados com tantos outros. Admiti que passei a gostar de receber “kudos”!!! “O quê? Escudos!”… “Não pá, KUDOS. os “likes do Strava”. També os comentários e elogios às fotografias que fui, e vou, tirando. Agrada-me partilhar a minha jornada pedaleira nesta rede social. Afinal, a nossa vida é bem pouco inspiradora.

Eu não percebi na época que me estava a juntar às fileiras de uma classe crescente de novos atletas, mas nunca me encaixei no papel de atleta. Nunca tive ilusões de nada. Para além de ter sido um gajo acima do peso ideal, não lutei por recordes, não engrossei Granfondos, Zwift’s, ou isso, nem me atirei como um louco nas descidas. Em vez disso, segui um caminho diferente, enchendo as pernas de ácido láctico, como cicloturista, desfrutando e babando nas subidas.

Há dez anos atrás era apenas dez anos mais novo. Sim, é uma afirmação óbvia, mas quando me revejo em termos velocipédicos muita coisa evoluiu. É evidente que contínuo um ciclista urbano, cada vez mais enferrujado, mas o facto é que nestes anos todos pedalei e visitei muitos locais que de outra forma certamente não conheceria. Esta fantástica ferramenta permite-me manter um arquivo histórico, por onde e com quem pedalei, e que posso consultar a qualquer momento.

Alcancei alguns reptos pessoais, físicos e mentais, me deparei com a maldita da diabetes, tive alguns acidentes, vi amigos irem e virem. Melhorei sobretudo a minha experiência em cima de uma bicicleta. Juntei as pedaladas laborais, o #commutescount, à contabilidade pessoal. Uni esforços reivindicativos com a legião de guerreiros de fim de semana, totalmente relegados no direito a circular na estrada. Basicamente procurei aproveitar o extraordinário efeito transformador que as bicicletas tiveram em mim.

Não domino o teletransporte, mas quando viajo no tempo de volta a abril de 2015 percebo que, até hoje nestes 10 anos de constante movimento, já percorri mais de 100 mil quilómetros. Estes números redondos apenas alimentam o meu ego e reforçam a dependência que tenho cada vez mais das minhas bicicletas. Venham daí os próximos capítulos.

 

BRM Soajo 200… “não há espiga”

paulofski @ na bicicleta

Publicado em 21/03/2025 às 11:53

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Desta vez não me esqueci de ligar o despertador e saí do Porto bem cedinho, ainda com a última saída solitária e atabalhoada de Esposende no pensamento. Penso ter sido o segundo a chegar a Marinhas, o habitual ponto de depart dos Brevets a norte, numa manhã gelada e cinzenta, mas com o mote musical dos Foo Fighters, em “minha honra” e a desejar-me “um dia frio ao sol”.

E assim foi, um belo dia ao sol, onde cerca de quarenta randonneurs, entre eles duas randonneuses ucranianas, Mari Pori e Bori Sova mais dois amigos Riazor oriundos da Galiza, juntaram forças e coloriram as estradas rumo à vila de Soajo, o ponto alto do dia. Mas antes de lá chegarmos tínhamos um longo caminho pela frente. Não sendo nada fácil, foi um percurso bastante agradável de ser feito e que me fez reviver algumas das memórias vividas nos vários brevets percorridos pelo verde Minho.

Um percurso com séculos de história, passagem de vidas peregrinas, ora movidas pela fé, ora entregues aos afazeres e tradições populares, através de estradas tranquilas, vistas esplêndidas e aldeias rústicas. As levadas (canais de irrigação) estão sempre presentes no caminho, no certo e longo Caminho, do pão e da fé. Eram usadas para o regadio dos campos de cultivo e para movimentar os moinhos que transformavam o grão na farinha, bem como orientar e refrescar peregrinos ao longo dos caminhos.

Depois de rondarmos o rio Neiva e mais à frente cruzarmos o rio Lima, que nos voltaria a assomar na vinda, iniciamos as primeiras subidas para chegarmos em bom ritmo ao primeiro local de controlo. Com a indicação para um pequeno desvio da estrada principal, paramos junto a um belíssimo solar datado de 1864, assim consta no portão o número que deveríamos indicar no cartão do Brevet. Retratada no seu romance homónimo, a Casa Grande de Romarigães, está intimamente ligada também à vida e família do escritor Aquilino Ribeiro.

Por essa altura a manhã estava perfeita, céu quase limpo, apenas algumas nuvens solitárias, sem vento e com a temperatura a aconselhar o alívio de alguma roupagem. Finalizadas as necessidades, viramos rumo a Paredes de Coura pela bucólica N301, subindo e imaginando as doçarias que iriamos escolher no segundo posto de controlo, uma pastelaria no concorrido centro histórico em dia de mercado. Pacientemente, o José Ferreira aguardava a nossa chegada e registou a nossa passagem no cartão com a primeira carimbadela. Sento-me à mesa e sou reconhecido pelo Andy, amigo das redes sociais e que pedalava pelo seu quintal de adopção.

E como sempre nos PC’s, uns chegam e outros continuam Lá vai o Andy (boa recuperação amigo). Depois de subirmos até quase aos 600 metros, descemos ao rio Vez para, outra vez, voltar a subir, isso tudo e muito mais. Algumas das estradas a percorrer não eram novidade para mim, mas subir o Soajo seria. A visita à já conhecida cidade de Arcos de Valdevez foi fugaz e, como tal, embalamos.

A crescente inclinação da estrada seria uma ninharia para os prazeres que retiramos desta coisa do cicloturismo. Eu, claro, estava a suar mas também a estava a saborear. A manhã foi, entretanto, mudando de humores, ficando cada vez mais escura, mais ventosa, arrefecendo abruptamente.

No topo, a recompensa foram as vistas, incluindo o vislumbre da alva neve lá no topo da Serra do Gerês e que o Pawel fez questão de subir ali para a fotografar.

No coração do Parque Nacional da Peneda-Gerês, a Serra do Soajo é uma das suas atracções mais vibrantes e procuradas. Conhecida pelos seus fotogénicos espigueiros e pela exuberância da natureza envolvente, a aldeia do Soajo tornou-se uma terra muito procurada e visitada. Uma terra que o turismo pôs no mapa, e que a comunidade que nela reside a tem sabido preservar, o seu passado, a sua cultura e a sua autenticidade.

Com o entusiasmo de um prato de sopa que imaginava à minha espera, invadimos a aldeia pelo Largo do Eiró, procurando vestígios da história, arquitectura e o evidente orgulho que os seus conterrâneos têm na sua terra.

Um dos exemplos é o cão sabujo da serra do Soajo: “sabujo” porque é de caça grossa, e serra do Soajo porque não é um cão qualquer. Diz que é “a matriz de muitos cães portugueses”. Esta raça tem a particularidade de ser o cão que no tempo da monarquia, todos os anos os soajeiros enviavam aos reis de Portugal e que, por tal oferta, beneficiaram da isenção de impostos e outros privilégios.

Antes de ir provar a sopa e iguarias d’as Marias, subi lá em cima à Eira do Penedo e fui ver o ex-líbris da povoação. Há quem lhes chame espigueiros, há quem lhes chame caniços, os mais conhecidos estão concentrados numa eira comunitária, assentes num afloramento granítico onde 24 destas altivas construções sobressaem pelo conjunto e pela beleza.

Os espigueiros eram utilizados para guardar o milho, deixando-o bem arejado e protegido de pragas. Consta que o espigueiro mais antigo data de 1782, não identifiquei qual, estando classificado como Imóvel de Interesse Público desde 1983.

Reunimos o grupeto, com o Alain, o Pawel, o Nelson mais o Jorge e voltamos à estrada, que ia descendo abruptamente para o Lima. A natureza à volta convidava a seguir cada vez mais lento, apertando os travões e apreciando as extensões de terreno onde o cultivo do milho, a criação do gado nas brandas pastorícias são predominantes. Ao longo da estrada íamos vislumbrando as vacas cachenas, ovelhas, e ainda tivemos o encontro feliz com alguns cavalos selvagens do Soajo, o cavalo garrano.

Atravessada a ponte, junto à antiga central hidroeléctrica do Lindoso e ultrapassadas aquelas dezenas de metros de um paralelo manhoso e escorregadio, seguimos tranquilamente ao lado do rio com a cara ao vento, até Ponte da Barca.

Ah, mas havia ainda uma subida pela frente. Revisitamos a ascenção da N101 para a Portela do Vade, onde no ano passado me lembro de nos arrastarmos por ali no decurso do BRM300. Graças à conversa, desta feita a escalada passou depressa, até voltarmos a descer, a voar e a arrefecer.

Foi já sob uns grossos e gelados pingos de chuva que chegámos juntos ao último controlo em Vila Verde. O Zé Ferreira aguardava-nos na esplanada de uma cervejaria onde, para além de boa cerveja artesanal, sobressaiam saborosas sobremesas. Já não tive direito à doce regalia, mas fui salvo pela meia sandes de presunto que trazia no bolso desde o Soajo, hidratada por uma “bejeca” preta, que também fez milagres.

Para os derradeiros quarenta quilómetros os motores estavam já em modo “ralenti”. A cadência ia sendo doseada, as forças partilhadas, enfrentando um vento cada vez mais agreste que soprava frontal. Ultrapassada a malha urbana de Barcelos onde tivemos de lidar com o um tráfego enervante, não demorou meia hora para em Esposende avistarmos o oceano e reencontrarmos a N13, que seguimos até chegarmos em absoluta camaradagem ao ponto de chegada que também foi o de saída, em Marinhas.

E pronto, mais um evento soberbo por velhas estradas e serras minhotas. Magnífico roteiro desenhado e bem organizado por José Ferreira e Manuel Miranda, que também estiveram pessoalmente nos postos de controlo e onde tão bem nos receberam. Um muito obrigado à voluntariosa dedicação destes nossos amigos, que abdicaram da sua participação no Brevet, e que mais uma vez nos proporcionaram um excelente dia de pedalada.

– E o acumulado? – “Não há espiga”.

 
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