paulofski @ na bicicleta
Publicado em 20/01/2025 às 15:27
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Recordo, e partilho, o texto da Petição / Carta Aberta “Cidades Seguras para todas as pessoas”, que a Estrada Viva, “rede de associações, designada oficialmente por EV – Liga de Associações pela Cidadania Rodoviária, Mobilidade Segura e Sustentável” (publicada no jornal Público no dia 21 de novembro de 2021), dirigiu ao Presidente da Assembleia da República e ao Primeiro Ministro de então, dando assim o mote para este postal.
“O que nos define como sociedade evoluída é o modo como tratamos os mais vulneráveis: as crianças, as pessoas mais velhas e as que têm mobilidade reduzida. O espaço público é o espelho das nossas escolhas: se os mais vulneráveis entre nós podem mover-se com liberdade, independência e segurança, todos teremos os mesmos direitos. Mas as nossas cidades têm sido desenhadas para dar prioridade ao automóvel, com vias que convidam ao excesso de velocidade, que não é fiscalizado, criando graves situações de insegurança para todos. Portugal tem dos piores indicadores de segurança rodoviária dentro das localidades da União Europeia [1]. Temos que mudar esta situação.
Em 2019, morreram em Portugal, por atropelamento, 134 pessoas a pé e 26 em bicicleta, a maioria dentro de localidades [2]. Um peão atropelado a 50 km/h só tem cerca de 20% de probabilidade de sobreviver, enquanto a 30 km/h tem cerca de 90% de probabilidade de sobreviver [3].
Em 2017, os Ministros de Transportes da União Europeia assinaram a Declaração de Valeta, que inclui o objetivo de reduzir a zero o número de mortes nas estradas europeias. Como consequência a Comissão Europeia e o próprio Estado Português adotaram a “Visão Zero”: todas as mortes na estrada são eticamente inaceitáveis. A promoção da segurança rodoviária só é eficaz quando assenta num pressuposto básico da ”Visão Zero”: errar é humano. Temos, por isso, de garantir que os erros que inevitavelmente serão cometidos, não sejam erros mortais. O primeiro passo é reduzir a velocidade.
Em 2020, Portugal assinou a Declaração de Estocolmo. Nela se estabeleceu claramente que os Estados signatários deverão priorizar a gestão da velocidade como uma intervenção chave de segurança rodoviária, em particular para “fortalecer a aplicação da lei, para prevenir o excesso de velocidade e determinar uma velocidade máxima de 30 km/h conforme apropriado nas áreas onde utilizadores vulneráveis e veículos se misturam … ”. A Declaração de Estocolmo ressalta ainda que os esforços para reduzir a velocidade têm um impacto benéfico na qualidade do ar e nas alterações climáticas – não haverá mobilidade sustentável sem segurança, nem segurança sem mobilidade sustentável.
Em maio de 2021, a Organização Mundial da Saúde (OMS) patrocinou a 6ª Semana Global de Segurança no Trânsito da ONU, a destacar os benefícios de ruas de baixa velocidade em áreas urbanas e apelando aos países a limitar as velocidades a 30 km/h nas ruas partilhadas entre peões, utilizadores/as de bicicleta e o tráfego motorizado. A OMS, baseada em inúmeros estudos epidemiológicos, é muito clara: o risco de morte e ferimentos reduz consideravelmente quando as velocidades praticadas são abaixo dos 30 km/h.
O Parlamento Europeu, em outubro de 2021, aprovou – com 90% de votos a favor – a recomendação da adoção de uma velocidade máxima de 30 km/h “em zonas residenciais e com um elevado número de peões e utilizadores de bicicleta”, argumentando que o excesso de velocidade é um fator determinante em cerca de 30% dos sinistros rodoviários mortais.
Também queremos zero mortes nas ruas e estradas de Portugal. Vimos, assim, apelar à Assembleia da República e ao Governo que Portugal cumpra a Declaração de Estocolmo, as recomendações da OMS e do Parlamento Europeu e altere o limite máximo de velocidade de 50 km/h para 30 km/h em áreas urbanas, onde o tráfego motorizado interage com peões e utilizadores/as de bicicleta (definido no Código da Estrada como “dentro das localidades” com a excepção de “vias reservadas a automóveis e motociclos”).”
Ainda janeiro vai a meio e já soma um registo trágicio de cinco pessoas mortas no exercício do seu modo de transporte em bicicleta. Têm vindo a aumentar de um modo assutador o número de vitimas resultantes de acidentes rodoviários e atropelamentos nas estradas e ruas do nosso país. É demasiada gente que sai e não chega a casa ou ao destino onde se propunha chegar. É urgente alertar, conciencializar, para evitar este “genocídio” rodoviário. É urgente, reduzir, acalmar, refletir… Fazer qualquer coisa para modificar certos comportamentos nas estradas. O excesso de velocidade, as manobras perigosas, o uso do telemóvel durante a condução. Nós que pedalamos diáriamente para diversos fins e destinos tentaremos ser mais atentos e cuidadosos na estrada.
No domingo passado, numa manhá gélida e chuvosa, mais de 90 ciclistas, homens, mulheres, crianças, animais, acompanhados por vários agentes de autoridade em bicicleta e pela comunicação social (RTP, SIC e TVI), percorreram em desfile algumas ruas do Porto manifestando-se e sendibilizando para segurança e prevenção rodoviária, para a necessidade de melhores infra-estruturas urbanas exclusivas para a circulação das bicicletas, estradas seguras para todos os utilizadores vulneráveis das vias públicas. No nosso pensamento estava a memória das pessoas falecidas em desastres de viação, sobretudo aqueles que como nós se deslocavam neste simples modo de locomoção que é a bicicleta. De igual forma, prestamos a devida homenagem às equipas de emergência, aos profissionais de saúde e agentes de autoridade que diariamente lidam com as consequências traumáticas da sinistralidade.
Vamos lá, partilhem a estrada com segurança.
Nota: Poderão ver os videos e mais fotos do movimento na actividade (clicar para ver) que registei no Strava.
paulofski @ na bicicleta
Publicado em 13/01/2025 às 15:50
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Anos atrás, após passar a fasquia dos cinquenta, fui diagnosticado com Diabetes tipo 2. Sem ficar admirado com isso, aqui o factor hereditário, de pai para filho, imperou de facto. Reconheço que fiquei um pouco assustado. O meu médico prescreveu medicação diária e me disse o que poderia ou não comer. Zero de açúcar. Meti na cabeça um plano dietético rígido e aumentei a actividade física que incluía a corrida. Só que detesto correr. Se eu já pedalava bastante, as rotinas diárias na bicicleta acabariam se tornando mais necessárias e alargadas. Em seis meses perdi seis quilos. O meu estado físico alterou significativamente mas percebi que o meu corpo reagia de forma repentina, mediante as exigências físicas face às necessidades calóricas. Por diversas vezes tive encontros imediatos com o “Homem da Marreta” e percebi que já não me sentia invencível.
O equilíbrio é delicado. A longo destes anos a bicicleta tem-me proporcionado o melhor remédio para encontrar esse equilíbrio. Para além do óbvio, o ciclismo é de facto uma metáfora quase perfeita para o “equilíbrio”. Estou ciente da importância da alimentação a ter e a manter esse tal equilíbrio, entre carbo-hidratos, proteínas e a ingestão de calorias. Demasiados carbo-hidratos e o meu açúcar no sangue sobe, muito poucos e eu “bato na parede”. Se o exercício diário e prolongado é parte da equação, saber dosear as necessidades é uma importante aprendizagem. Aprendi a “ler”o meu corpo.
A bicicleta é uma coisa maravilhosa. A sua mecânica depende do “motor”, ou seja, do ciclista, e o motor depende do combustível. A bicicleta é a minha rotina saudável, que torna os meus dias de pedalada longa em dias de batota. Naqueles dias que eu acho que tenho desculpa e posso enganar os “diabretes”. Naqueles dias que eu acho que posso consumir à vontade o pão que me apetecer, uma coca-cola e um pastel de nata só para desenjoar. Não é que eu ande a comer muito queijo, mas nesses dias permito-me conquistar castelos e esquecer a maldita doença.
paulofski @ na bicicleta
Publicado em 5/12/2024 às 10:15
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Mal saiu o calendário dos Randonneurs Portugal para o próximo ano, recheado de boas e desafiantes novidades, assinalei o Brevet Évora 200. O primeiro evento da época breveteira para 2025, que se realiza no último dia de Novembro de 2024, fez-me logo pensar que poderia juntar o útil ao agradável. Pedalar e passar um par de dias com a minha cara metade numa cidade onde já fomos felizes.
Mais do que revisitar Évora num fim-de-semana, pedalar 200 km em boa companhia, por estradas ondulantes, esburacadas q.b. e com poucos carros a chatear, era por demais aliciante. Depois de toda a logística tratada com antecedência, na sexta-feira à tarde fiz-me à autoestrada mais a Maria, com a bamBina Pinarello amarrada no tejadilho da viatura rumo à capital do Alentejo, O extra seria o de, pela primeira vez, participar no BRM Évora 200.
“Cicloturistar” pelo Alentejo é sempre uma experiência gratificante. Já tinha dito isto, não já? É que a memória ainda guarda momentos fantásticos da minha travessia pela N2. Das paisagens ondulantes, das estradas silenciosas, das pessoas e do modo de vida secular da região. Desta vez, porém, teria a companhia de sessenta e seis outros ciclistas, a pedais, com máquinas infernais e de coletes fluorescentes.
Sábado de manhãzinha, depois de percorrer estreitas ruas de paralelos rombudos e escorregadios, o pessoal foi-se juntando para o inevitável bikechecking, proporcionando encontros e reencontros, conversas de circunstância, apreciações das bicicletas em exposição, até que se deu início ao bike tour, saindo em pequenos magotes pelos arruamentos históricos da cidade considerada património mundial da UNESCO.
Enquanto a suave neblina se ia dissipando, o sol nascente espreitava dando um tom luminoso fenomenal ao asfalto e aos descampados. Depressa nos livramos das cercanias urbanas e nos vimos envolvidos pelas soalheiras planícies alentejanas, ideais para qualquer tipo de ciclismo, onde a beleza natural é um constante panorama à nossa volta. Não resisti a parar para captar um momento fotográfico, suficiente para de imediato me obrigar a dar bem à perna se queria apanhar os fugitivos.
Uma brisa fleumática, misturada com aquela ânsia de calcar os pedais, tornou o meu ritmo veloz e, só passados uma vintena de quilómetros, à entrada de Machede, consegui finalmente alcançar as rodas do Pawel e do Nelson, formando assim um trio ciclista por todo o brevet. “Breveteiros” vindos do norte para participar no brevet mais a sul, éramos poucos mas eramos bons. Cof…cof…
Embora planos, os quarenta quilómetros seguintes não nos permitiam uma pedalada tranquila. O asfalto remendado, e em alguns locais bem esburacado, obrigava o ciclista a cuidados redobrados. Atentos aos poucos carros que surgiam, fomos rodando tranquilamente, até que por nós passa zunindo um dos três Velomobiles, tão rápido que nem tive tempo de o fotografar. Passada a localidade de Montoito prosseguimos para Reguengos de Monsaraz, onde faríamos o primeiro controlo num pequeno café.
Carimbado o cartãozinho amarelo, bastou a necessidade de ir verter águas para, entretanto, voltar e me deparar com um pelotão esfomeado rodeando o balcão do café. Felizmente, mesmo ali ao lado na praça, uma confeitaria bem fornecida providenciou o meu primeiro abastecimento sem grandes demoras. Fotografias e reajustes na vestimenta, logo retomamos a pedalada para ir admirar o Alqueva e a vila fortificada de Monsaraz, bem lá no cimo do lago.
A escalada do dia estava em acção. Boquiaberto com as lonjuras a perder de vista, note-se que a respiração e o coração acelerado não tiveram nada a ver com isso – certo!? – novo posto de controlo no miradouro junto ao icónico monumento de homenagem ao Cante Alentejano. Rápido se reagruparam alguns breveteiros, ofegantes da curta mas exigente subida. Depois dos cliques fotográficos ao Alqueva e a outros, prosseguiu-se para a descida, deixando uma visita à vila e ao castelo para outras núpcias/férias.
Recomendado pelo Nelson, fizemos uma breve paragem em Telheiro para apreciar e fotografar o seu original e belíssima fonte e chafariz azul e branco. Bem ao estilo alentejano. Informação recolhida posteriormente, pelas inscrições na fonte podemos confirmar a sua existência desde tempos remotos. “O chafariz foi contruído em 1422, mais tarde em 1723 foi construída a fonte atual, e em 1930 esta foi alvo de obras de recuperação.” Com isso, fomos alcançados e acabamos engolidos por um minipelotão, que montados nas suas máquinas modernas seguiam a bom ritmo, atravessando montados de sobreiros e azinheiras.
Diz que o Alentejo é todo plano! Pois é, excepto quando não é. A ondulação do asfalto da estrada M514 passou a ser o prato forte, mesmo antes da hora de almoço. O grupo revezava-se, uns iam entrando, outros iam saindo, conversas de circunstância, quando dei por mim estávamos às portas da Vila do Redondo. Com metade do brevet concluído, era chegado o momento sempre desejado de confortar as barriguinhas.
Numa esplanada da praça da vila ficava o terceiro posto de controlo, onde um dos voluntários, essenciais na realização dos brevets, se encarregava de registar a chegada dos participantes. Carimbado o cartão, fui de imediato tratar do mata-bicho e engrossei a bicha no Beldroegas Bar, à espera da sopinha e da sandes de presunto. Até deu tempo para reparar nas paredes do estabelecimento estavam decoradam com vários motivos tauromáquicos e monárquicos, o que revela muito dos costumes saudosistas desta terra.
O Alentejo é uma região repleta de aromas, cores e património cultural. Seja pelas paisagens verdes e douradas intocadas, pelas colinas ondulantes, pelas casinhas de cal branca com retoques azulados, das aldeias medievais e cidades históricas, dos castelos, igrejas, palácios e conventos, agora convertidos em alojamentos requintados, seja qual for a razão e motivação, um passeio de bicicleta por aquelas paragens é sempre deslumbrante. As milenares tradições, história e cultura que esta região vinícola tem para oferecer, torna este pedaço de Portugal um local pitoresco e cheio de charme.
O que não é nada charmoso é ter de percorrer parte da estrada nacional nº 4. Se os bons argumentos paisagísticos estavam ainda presentes, a sujidade desta estrada, aliado ao bulício rodoviário, veio a revelar-se algo problemático. Espalhados pela estrada, restos de pneumáticos de camiões eram um perigo eminente para os pneumáticos fininhos das nossas biclas. Pedalávamos nós a bom ritmo até que se escuta o gutural berro de alguém: “FURO”, e rapidamente se acionaram os travões. O recanto junto aos portões da Quinta das Cerejas tornou-se assim um providencial refúgio para a nossa paragem forçada.
Se a fama do pneu Continental 5000 à resistência ao furo é sobejamente conhecida pela malta das biclas, já a resistência do pneu para sair do aro é desesperante. Passados longos minutos de uma luta desigual, só mesmo com a força bruta conjunta de seis mãos se obteve sucesso. Um pedaço de arame espetado na borracha denunciava o móbil do crime. Escusado será dizer que, trocada a câmara, voltar a colocar o pneu no aro foi outro filme… de suspense!
Continuamos então para norte, rumo a Estremoz, famosa pelo mármore branco e pelo seu castelo. Ao longo da estrada outros dois grupetos que jaziam parados, também vítimas da EN4, a reparar furos. Estremoz é mais um bom spot para reabastecer energias, “num posto de controlo onde a doçaria vale mesmo a pena”, diz no site dos RP, mas que me desculpe o senhor do café. Bolo Jesuíta tem de ser o de Santo Tirso, que é bem diferente daquele que comi, mas, a bem da verdade, digo-vos que estava mesmo fresquinho.
Até Evoramonte a estrada volta à calmaria natural da região, mas a topografia vai aumentando, gradualmente. Avistamos o inconfundível e imponente castelo lá no cimo. Diz que as vistas que a vista de lá alcança são espantosas, mas não o fomos visitar. Tivemos de parar no centro da vila para novo controlo de passagem, num café com uma questão sobre o café que deveríamos assinalar no papelucho amarelo. Vai daí, aproveitei a pausa para tomar outro café. Pois com certeza que teria de ser Delta.
Recomeçamos a bom ritmo, descendo. O percurso segue agora por estradas mais planas, com pequenas ondulações e campos abertos,a que já nos havíamos habituado. Reagrupamos com outros randonneurs e fomos entabulando conversas, sobretudo abordado pela persistente curiosidade dos meus companheiros de circunstância sobre a minha montada, recebendo vários elogios à beleza da bamBina Pinarello.
Uma viragem à esquerda e entramos no Vimieiro, uma pequena e típica aldeia alentejana que se diz ser terra de músicos. Não fomos recebidos com honras musicais, mas de novo obrigados a fazer um pit-stop para responder a outro quiz no cartãozinho do Brevet. Rapidamente a noite ia caindo, tornando cada vez mais visíveis as luzes vermelhinhas das nossas bicicletas, que se iam espalhando ao longo da estrada.
As estradas quase sem trânsito e a luminosidade do fim do dia davam uma atmosfera especial à pedalada. Avisam-me que fiquei sem a luz traseira. Pois um calculo mal efectuado no carregamento da bateria e o facto de me ter esquecido da luz suplente, fez com que fizesse a parte final desse modo. Embrenhado no grupeto sentia-me mais seguro, o que não me passou despercebido foi um rato cruzar-se mesmo à frente do potente feixe de luz dianteira da minha bicicleta. Não acabou esmagado por sorte, a dele!
Rodando em formação, martelavam-se os pedais a bom ritmo, em concentração máxima. Não tardou muito a que avistássemos a placa indicadora da nossa entrada no concelho de Évora. Logo, logo, estávamos a calcar de novo os paralelos rombudos e escorregadios, primeiro ao redor e depois dentro das muralhas. Batiam as 18 horas e o transito em direcção ao centro entupia as estreitas ruelas evorenses. A chegada foi algo atribulada, mas com sucesso total. Todos os “concorrentes” chegaram ao final, felizes e contentes.
O Alentejo é sempre um dos destinos a revisitar e uma experiência de pedal a não esquecer, e este Brevet é muito mais do que um loop de 200 quilómetros. É um excelente convívio com outros da mesma espécie e que como eu apreciam o desafio das longas distância. É uma volta pela história que vale a pena desfrutar. Totalmente diferente de estar num carro ou até num comboio ou autocarro. Ali não olhamos a paisagem pela janela. Eu e os meus amigos Pawel Pesz e Nelson Vaz fizemos parte dela.
Até Breve(t)
paulofski @ na bicicleta
Publicado em 12/11/2024 às 10:10
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Por estes dias, por estas noites, quem passa numa praça, avenida ou rotunda, quem simplesmente pedala pelo passeio, é envolvido e transportado pelo delicioso e persistente cheiro das castanhas a estalar nas brasas. É um aroma que cada português transporta desde a infância e que associa a momentos próprios desta época do ano. É um “cheirinho” que se liberta da carreta fumarenta e que nos invade inebriante as narinas. Irresistíveis e tostadas, as castanhas passam das mãos enegrecidas do assador para as nossas, envoltas num confortante cartucho de papel. Assim, muito boas e ainda quentinhas quando chegaram a casa, as castanhas deram calor e perfume às pedaladas. Só me faltou o copinho de jeropiga, que logo, logo, tratamos de a provar e as castanhas empurrar.
paulofski @ na bicicleta
Publicado em 26/09/2024 às 10:32
Temas: marcas do selim a caminho do Romeu amigo Couto Azibo bicicleta boas pedaladas Canyon cicloturismo ciclovia ciclovias combóio Ecopista Ecopista do Tua fotografia fotopedaladas gravel história Linha do Tua longas pedaladas Macedo de Cavaleiros Maneirinha Mirandela mobilidade motivação Natureza outras coisas Podence Portugal Romeu viagem
Antes de entrar no tema que me traz de volta, devo reforçar a minha opinião pessoal sobre o aproveitamento da adaptação dos abandonados canais de linha ferroviária em vias pedonais e cicláveis. A forma como nas décadas de 80 e 90 do século passado foram encerradas muitas linhas de bitola estreita, meramente pelo quero, posso e mando político, sem dar cavaco aos interesses do povo, e que foi bastante prejudicial em termos sociais e económicos para as populações e para o comércio que do comboio se servia, foi crime de lesa pátria. Nesses anos os governos cavaquistas arrasaram por completo a maior parte das infraestruturas ferroviárias do país, argumentando com interesses economicistas, o que permitiu a delapidação do património ferroviário pelos interesseiros da clientela de pacotilha.
Evidentemente que seria necessária uma restruturação e modernização da rede ferroviária nacional face ao investimento e desenvolvimento de infraestruturas rodoviárias, associada à lentidão do comboio perante o concorrente rodoviário, mas temos de admitir que alguns encerramentos foram injustos e funestos para as populações, no combate à interioridade e no desenvolvimento económico dessas regiões. Parece haver agora alguma vontade política para reverter alguns desses erros e reabrir algumas linhas, como tem sido a eterna promessa de recolocar os carris, reconstruir as estações e apeadeiros degradados, abrir as pontes deixadas ao abandono, da antiga Linha do Douro, no troço entre o Pocinho e Barca d’Alva! Só que nada de concreto se tem feito.
O percurso da Ecopista do Tua, desenvolve-se pelo canal da antiga Linha Ferroviária do Tua, que em Foz-Tua fazia a ligação com a Linha do Douro e dali levava os passageiros em linha estreita para o interior transmontano. Em 1887 foi inaugurado o primeiro troço até Mirandela e em 1906 foram completados os seus 133 kms de extensão até Bragança. No seguimento dos encerramentos unilaterais de muitas linhas férreas deste país, em 1991 o troço entre Bragança e Mirandela foi definitivamente encerrado. Os carris e o material circundante foram sendo retirados, mesmo perante a oposição e os protestos das populações. Em 1995 foi reaberto o troço entre Mirandela e Carvalhais para o Metropolitano de Superfície, sendo a exploração do serviço de passageiros realizada pela empresa “Metro de Mirandela”, serviço que já foi desactivado. A circulação ferroviária manteve-se entre Mirandela e Foz-Tua, entrando sucessivamente em declínio, resultando em graves acidentes ocorridos entre 2007 e 2008. Os carris são então arrancados e é iniciada a construção da barragem de Foz-Tua, o que leva ao encerramento definitivo desta linha de comboios, considerada por muitos (infelizmente nunca a percorri) como uma das mais belas do mundo.
A reconversão em ecopistas, ecovias e ciclovias destes antigos canais ferroviários é uma forma dos municípios aproveitarem e preservarem parte deste património abandonado. O investimento para fins recreativos e turísticos permite ao novo utilizador conhecer o remanescente património paisagístico e arquitectónico das antigas linhas de comboio. Desta forma pode-se conhecer, ou recordar, quase à mesma velocidade das viagens do passado, o traçado serpenteante destes canais rasgados pela força do Homem. Contemplar paisagens magníficas sobre os vales escarpados dos rios. Conhecer a riqueza cultural, a natural e das populações. Visitar recantos deste património da humanidade entre socalcos e serras. Divulgar a cultura de um Portugal profundo e que era tão bem servido por este magnifico meio de transporte.
Nesta epopeia de três dias, o cicerone Manuel Couto e este que se fez convidado viajamos com as nossas companheiras de duas rodas no comboio Miradouro ao longo do rio Douro para, no Pocinho, iniciarmos a pedalada, tendo como destino final a pequena aldeia transmontana de Romeu. Ao invés da primeira vez que lá fui, e que percorremos de bicicleta o que resta da antiga Linha Ferroviária do Corgo entre a Régua e Vila-Real, desta vez aproveitando o asfalto da EN102, em lugar de reviver o gradual esplendor panorâmico da Ecopista do Sabor, encurtamos de sobremaneira a pedalada, sem, no entanto, acumularmos um bom esforço para lá chegar.
O primeiro contacto que tive com a ciclovia da antiga Linha do Tua foi no curto troço asfaltado dentro da cidade de Macedo de Cavaleiros. No centro, a antiga estação foi remodelada e reparei no cuidado que tiveram em construir uma espécie de “estação de serviço” para os ciclistas, com biciparques, ponto de carregamento para e-bikes e uma estação para lavagem e pequenas reparações. Ponto negativo que tenho a apontar são os inúteis balizamentos existentes ao longo da ciclovia. Certamente que estruturas deste tipo se justificam para a segurança dos ciclistas, sobretudo no cruzamento com as estradas, mas no caso, muitas delas não se justificam e só dificultam a passagem dos ciclistas, especialmente aqueles que viajam em modo bikepacking com alforges laterais nas bicicletas. Depois, o ciclista mais afoito para evitar entrar nestas “ratoeiras” passa à volta em algumas delas!
Após o jantar, e de iluminação ligada pela estrada afora, fomos dormir a Romeu para continuarmos a jornada no dia seguinte.
(aqui o registo “stravico” da jornada)
Antes de darmos ao pedal, juntou-se o Joel e assim se formou um trio ciclocurioso, um numa bêtêtê pura, outro numa espécie de motocross a pilhas e eu numa aspirante a gravel bike e que se fez grande. Seguindo a primeira sugestão do Couto, fomos revisitar e dar a conhecer ao Joel as memórias de Clemente Menéres, industrial portuense que nos finais do século XIX revolucionou a região, especialmente na exploração da cortiça. Abandonámos as bicicletas no mato e subimos a fraga granítica onde se tem um dislumbre mágico da Natureza envolvente.
Pelo caminho confirmou-se estar aberto à circulação o ultimo troço recuperado do antigo canal ferroviário da Linha do Tua e assim se decidiu rumar a Macedo de Cavaleiros. O traçado em gravilha está inserido na mata do Quadrassal, uma extensa mancha natural de sobreiros e bosques de sobreiro e zimbro. Território integrado na Rede Natura 2000, uma área protegida tutelada pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, que abrange a União de Freguesias de Avantos e Romeu, as freguesias de Cedães e de Vale de Asnes, no concelho de Mirandela, e a freguesia de Cortiços, no concelho de Macedo de Cavaleiros.
Depois de um reforço calórico decidimos ir pedalar junto às calmas águas da Albufeira do Azibo, por um trilho suave, local de grande beleza e importância turística, mas sobretudo ecológica. Depressa chegamos à famosa praia fluvial, onde nos detivemos para um bom almoço e dali traçarmos os objectivos para o resto do dia, antes do regresso à aldeia de Romeu para o repasto no Restaurante Maria Rita.
Ficou logo decidido que iriamos fazer o trilho em “loop” de 25km à volta da albufeira, mas ainda antes dessa aventura, e para se fazer uma boa digestão, demos uma saltada a Podence para algumas tropelias. A aldeia estava muito mais calma, tendo em conta a última vez que por lá andei, e depois de umas fotos e explorações, os caretos não quiseram saber de nós, e nós descemos de novo à praia, para o inevitável mergulho antes da boa da suadela.
Ainda envolvidos pela serenidade das águas azuis da albufeira e pelas margens arborizadas que a rodeiam, aos poucos a rota tornou-se desafiante. O trilho sai das margens e à passagem junto à aldeia de Santa Combinha dá-se o inicio a um sobe e desce sem misericórdia. A minha Maneirinha não se fez rogada, nem aos declives e muito menos ao terreno inóspito para uma bicicleta com pneus de 30mm! Claro que, para o meu bem-estar físico, respeitei o terreno e apeei nos pontos mais complicados do percurso, especialmente quando tinha demasiada areia e pedras soltas.
À medida que fomos explorando uma das joias naturais de Portugal, deixamos de vislumbrar as águas e ficamos embrenhados pela mata de sobreiros, pela solidão e pela vida selvagem. Consultando o traçado no GPS, mergulhados na beleza da natureza e desfrutando de vistas deslumbrantes, descemos de novo à tranquilidade das águas da albufeira e a um céu repleto de nuvens lenticulares. Por alturas da barragem do Azibo seguimos por estrada para Vale da Porca, onde após um lanchinho e pedalada mais rápida, junto ao antigo apeadeiro de Castelãos retomamos o alcatrão da Ecopista. Deste local em diante, na direcção de Bragança, o antigo troço da Linha do Tua permanece abandonada e à espera da reconversão. Recolocamos os pneus no asfalto da ciclovia e mais à frente a terra batida da Ecopista em direcção a Romeu.
Definitivamente esta rota é perfeita para caminhantes e amantes da natureza, para o lazer de um dia em família, para ciclistas de todos os níveis de habilidade usufruírem de uma experiência agradável, que tanto pode ser um passeio tranquilo ou uma aventura deslumbrante.
(aqui o registo “stravico” da jornada)
No terceiro dia da nossa jornada, com o bacalhau do Maria Rita bem digerido mas com a mousse de chocolate com azeite ainda no pensamento, arrumadas as trouxas fizemo-nos à estrada e retomamos o troço de Ecopista que ainda faltava percorrer, de Romeu para Mirandela. Antes disso, o Couto levou-me a um dos pontos altos da, também conhecida como, aldeia das rosas: o Santuário de Nossa Senhora de Jerusalém, pequena capela rodeada de olivais e que fica bem no alto, de onde se pode desfrutar de uma paisagem sublime.
A história de Jerusalém do Romeu está intimamente ligada à história da família Menéres, ao fundador e descendentes que aqui investiram na agricultura e criaram postos de trabalho e condições à fixação dos seus trabalhadores e famílias. O fundador Clemente Menéres foi também o grande impulsionador da construção do caminho de ferro, principalmente para o escoamento da cortiça. Velho edifícios, como a antiga escola primária, os armazéns da Quinta do Romeu e a abandonada estação de comboios, são construções que resistiram ao tempo e preservam o passado. Outro local de muita e surpreendente história, que juntamente com o Restaurante Maria Rita atraia visitantes, era o Museu das Curiosidades, que duplamente tive a oportunidade de visitar mas que infelizmente foi encerrado.
Passada a antiga passagem de nível, onde se atravessa a EN15, uns metros mais à frente, temos a primeira interrupção na progressão pela Ecopista. A antiga ponte ferroviária de Jerusalém do Romeu ainda não foi restaurada, fazendo com que para se retomar a pista da outra banda do vale, o cicloturista ter de fazer um pequeno desvio, primeiro com uma suave descida, para, posteriormente, enfrentar a correspondente e exigente subida.
A partir deste ponto da Ecopista, a paisagem muda radicalmente, fazendo com o que o ciclista cruze terrenos agrícolas e vinhedos. O trilho segue ao lado da estrada nacional até que, após passar ao lado da povoação de Vale de Lerda, volta a ver interrompida a passagem por outra ponte ferroviária com a data de restauro em suspenso. Novo desvio e novo cruzamento numa desactivada passagem de nível, a Ecopista da extinta Linha do Tua segue agora a EN15 pela berma esquerda até ao cruzamento/rotunda para Carvalhais. A partir deste ponto para se entrar em Mirandela o ciclista poderá recorrer às faixas cicláveis desenhadas no asfalto, enquanto pode ir observando o troço agora abandonado do antigo Metro de Mirandela até à estação de comboios no centro da cidade.
Preparados para forrar os estômagos com o tradicional rancho à transmontana, com os bilhetes comprados para o autocarro das 18 e tal, fomos de barriga cheia fazer uma sesta para a relva refrescante da praia fluvial de Mirandela. Entretanto, e na incerteza quanto às exigências de transporte de bicicletas pelas transportadoras rodoviárias diz respeito, fizemos uma tourné ciclística pela cidade, visitando lojas dos chineses à procura dos maiores sacos de lixo do mercado. À hora marcada, na estação rodoviária, chegava o autocarro da FlixBus proveniente de Bragança e com destino ao Porto, abordamos o simpático motorista que, exibindo a sua proeminente barriguita, nos convidou a colocar as bicicletas sem requisitos no porão do autocarro. Depois disse-nos que também ele, em tempos, havia pedalado bicicletas!
(aqui o registo “stravico” da jornada)
Obrigado pelo convite amigo Couto. Venha a proxima aventura.
Publicado em 18/10/2021 às 23:22
Temas: bikepacking review
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A Triban no Gerês |
Comprei a minha Triban quase por impulso, em Novembro de 2019, quando em casa moravam já outras duas bicicletas de estrada. Estes modelos eram algo peculiares: uma Surly Long Haul Trucker, a bicicleta mais confortável em que já rolei, e uma velhinha Raleigh inglesa dos anos oitenta, que eu usava sobretudo para fins utilitários.
A minha antiga Surly |
O que eu procurava, já há algum tempo, era um modelo que permitisse substituir todas as outras bicicletas (as duas já citadas e uma BTT). A elusiva bicicleta única, que fosse capaz de fazer estrada a sério, viagens de longa distância, com carga, BTT em eventos e passeios, uso utilitário, e tudo o mais que se me ocorresse. E que fizesse tudo isto com alguma competitividade, que me permitisse participar ocasionalmente em eventos. Bem sei que não é pedir pouco, para mais de um modelo "económico".
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A Triban com todos os componentes de origem |
A escolha da Triban foi motivada, se for sincero, sobretudo pelo preço aliciante, tendo em conta tudo o que oferecia. Mas pareceu-me na altura uma solução de compromisso, já que eu considerava que a Decathlon tinha sido um pouco preguiçosa e simplesmente mudado o nome e a pintura a um dos seus quadros de estrada. Era apenas uma estratégia para a marca ter um producto que lhe permitisse concorrer no mercado na área então muito na moda, o "Gravel".
Bom, isso não deixa de ser um facto: trata-se de uma bicicleta de estrada, com algumas alterações, mas eu estava enganado. Para mim esta escolha veio a revelar-se extremamente acertada, e embora a bicicleta tenha certamente limitações, é difícil para mim ver alternativas viáveis neste momento. Vamos ver o que está em causa. (Nota: não tenho nenhuma ligação com a Decathlon e estas opiniões são minhas apenas).
Quadro: Para mim carbono estava fora de questão, por causa do uso para viagens longas em autonomia e o uso de bolsas de bikepacking. Os danos por atrito dos sacos ou numa queda são um risco demasiado grande. Aço e Titânio são materiais interessantes e esteticamente mais apelativos, mas mais caros e também pesados. Por isso alumínio acaba por ser uma boa escolha. O peso neste caso é apenas aceitável (os números estão no site). A surpresa veio da geometria. Eu tinha estudado a tabela e sabia que o quadro é exactamente o mesmo da gama de estrada. Portanto trata-se de um quadro "barato" de Endurance, com uma testa alta e uma posição pouco agressiva. Isso é ideal para longas distâncias e muitas horas no selim, e a geometria veio a revelar-se muito adequada para a minha fisionomia, depois de alguns ajustes. Eu não tenho muita flexibilidade natural e a minha postura não é muito agressiva. A bicicleta é muito estável em qualquer circunstância, mas mantém a capacidade de reacção e aceleração de uma bicicleta de estrada, que uma bicicleta de viagem (touring) não tem. E fora de estrada só em BTT mais sério perde a compostura, como seria inevitável.
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Cassete, corrente e pedaleiro alterados |
Grupo: A Triban vinha com um grupo Shimano 105 R7000 quase completo. Apenas a pedaleira era uma Shimano compacta de 11 velocidades, mas sem grupo, um pouco mais pesada que a 105 equivalente. Aqui eu achava que era mais uma das situações em que a Decathlon tinha feito a coisa mal, a cassete 11-32 (não Shimano) era demasiado pequena, e pensava na altura que a bicicleta deveria vir com um pedaleiro sub-compacto e talvez com um grupo GRX. A verdade é que esta mania da super-especialização dos componentes é muitas vezes exagerada. A transmissão não se desfaz se apanhar poeira por ser um grupo de estrada. O desviador Shimano 105 não é muito diferente de um Deore, as correntes e cassetes são aliás idênticas em vários grupos de estrada e BTT da Shimano, pelo que o desempenho fora de estrada não compromete. Já as relações de transmissão são claramente mais pensadas para o asfalto. Para rolar com peso extra e/ou fora de estrada (como sucede em bikepacking), optei por colocar uma pedaleira Miche 46-30 e uma cassete Shimano 105 maior, 11-34. Mesmo assim, eu agora reconheço que para um uso maioritariamente de estrada, a bicicleta vinha com um bom mix de peças. De tal forma que recentemente voltei a usar a cassete de 32 dentes original, para beneficiar de relações mais próximas entre si.
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Os travões facilmente se ressentem com o pó |
Travões: Os travões TRP mecânico-hidráulicos permitem casar um grupo totalmente mecânico, mais barato, nestes caso os shifters Shimano 105 R7000, com o modulação e sensações de um travão hidráulico. E a verdade é que funciona. Esteticamente é uma desgraça, mas funciona. Eu travo só com um dedo a maior parte das vezes. E a sensação de controlo é sempre boa. Há que notar contudo que estes travões estão mais à vontade em estrada, basta um pouco de pó para começar a haver vibrações e perdas de potência na travagem, quando em uso em gravilha ou terra. E só depois de uma limpeza cuidadosa é possível voltar a ter uma boa performance.
Guiador 44, mais estreito |
Periféricos: Não posso falar muito destas coisas, porque foi quase tudo substituído rapidamente. O guiador era demasiado largo, o meu quadro XL vinha com guiador de 46cm, com um desenho de drops com que eu não me identifiquei. Troquei por um simples FSA de gravel, abertura a 12º, de tamanho 44. Apesar de mais pequeno ainda permitia o uso de sacos de bikepaking. O avanço de 120cm foi trocado por um de 80, para afinar a posição na bicicleta. Muitas bicicletas de gravel modernas são desenhadas para avanços curtos, e neste caso a adaptação foi natural. Sim, ao princípio eu também achei que era muito curto, mas fez maravilhas pela postura e pelo controlo da bicicleta. Mudei também o selim, por outro muito semelhante, e o espigão do selim, por estética e peso.
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No Porto! |
Rodas & Pneus: Usei pouco as rodas. Eram robustas e não deram problemas, lembro-me que os cubos pareciam bastante bons para esta gama de preços. Foram trocadas por umas DT Swiss, para perder umas gramas. Os pneus Hutchinson Overide de 35mm são excelentes. Têm uma aderência teimosa e salvaram-me o pelo em mais de uma ocasião. Permitem aventuras fora de estrada que a sua diminuta largura não deixa prever. E em estrada rolam muito bem. Há melhor e mais leve (e mais caro), mas não muito. Quando comprei a bicicleta achei que os pneus eram mais um compromisso, agora acho que são um excelente compromisso! Actualmente monto pneus de 38mm, a marca só recomenda até 36, mas a verdade é que cabem 40mm se fizer falta. Mas penso voltar aos 35mm quando surgir a oportunidade, julgo que é o melhor equilíbrio estrada-gravel e a marca voltou a acertar neste aspecto.
Dois anos depois, dois Tróia-Sagres, uma volta a Portugal de várias semanas em autonomia, uma viagem a Madrid, o caminho de Fátima, uma subida à serra da Estrela, e muitas aventuras mais pequenas pelo meio depois, a Triban provou que não é só um modelo barato feito à pressa para seduzir os adeptos da "moda" do gravel. Não se deixem enganar pelas soldaduras mais abrutalhadas, nem pela palavra "Decathlon" na testa do quadro, a bicicleta foi bem pensada, o desempenho nunca compromete e tem alma para tudo o que se propuserem fazer com ela.
Set-up recente, na Serra da Estrela |
O facto de custar menos um terço ou metade dos modelos da concorrência também não é propriamente mau. Actualmente há vários modelos e cores disponíveis, baseados no mesmo quadro, que, consta, é fabricado em Portugal (o meu, especificamente, diz "made in France"). É possível também comprar um dos modelos de estrada da gama 520 e depois adaptar a um uso mais polivalente, já que o quadro é idêntico, mudando a pintura e a selecção de componentes.
Não tenho actualmente nenhuma outra bicicleta, nem sinto falta de nada. Sei que não é solução para toda a gente, o meu uso tem sido muito lúdico e mais estradista, ultimamente. Mas é inegável que esta proposta low-cost permite acceder a um inesgotável mundo de aventuras, cujos limites não serão impostos pela bicicleta.
Publicado em 23/07/2021 às 0:20
Temas: bikepacking viagem
Caramelos? |
Decidido a evitar mais apertões de calor e surpresas tardias na jornada, na manhã do quarto dia levantei o rabo da cama o mais cedo que consegui. Tomei o pequeno almoço, incluído na estadia, tão cedo quanto era permitido e fiz-me à estrada. Desta vez tinha alojamento reservado, e estava decidido a ter um dia diferente. Para minha surpresa consegui mesmo fazer a navegação para fora da zona urbana de Trujillo sem percalços. Normalmente o meu GPS não permite esses luxos, mas naquela manhã tudo corria sobre rodas.
Rumo a Este, como sempre |
É claro que esta bonanza não poderia ser duradoura. Depressa percebi que a altimetria para a jornada era mais desafiante que nos dias anteriores. E o que não mudava contudo, era a temperatura elevada, e as grandes distâncias entre terras, amplos espaços onde não havia nenhuma possibilidade de descanso, refugio do Sol ou reabastecimento. O Deserto Espanhol, como lhe chamam alguns Portugueses de passagem, a caminho de destinos mais populares na Península Ibérica, faz jus ao seu nome.
Olha, montanhas! |
A manhã foi gasta a deambular por estradas de montanha, a ritmos muito lentos, enquanto a temperatura ia aumentado, até ficar intolerável. Continuava a não haver sombras para parar, nem lugares onde obter água ou comida. O desgaste era grande e o moral da expedição ia descendo ao ritmo que desciam também as reservas de líquidos disponíveis a bordo. Começava a ficar claro que, mais uma vez, não ia conseguir arrumar a etapa a tempo de evitar o calor infernal da tarde, no Deserto Espanhol.
As coisas não são fáceis no deserto |
Umas bombas de gasolina foram a minha salvação. Estava a ficar viciado em Aquarius, a coisa mais parecida a uma bebida energética que era possível encontrar em quase todos os postos de abastecimento de combustíveis. Eventualmente a estrada "alisou", depois de uma longa descida, onde cheguei a passar dos 75km/h. Tinha voltado a ficar sem almoço pois não encontrei nada pelo caminho na hora apropriada, estava a ficar frito pelo Sol, mas sabia que já estava perto do destino.
Sombra! Para a bicicleta... |
Eu claramente já estava acusar o desgaste do calor, do esforço e da falta de comida. Foi neste estado que rolei até um cruzamento onde a estrada em que eu estava continuava para Oeste, coisa que não me interessava nada. Eu tinha que virar para Este, no sentido de Talavera de la Reina e Madrid. A minha dormida para a noite era em Oropesa, uma cidade a meio caminho. Rolar no sentido contrário era andar para trás,
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O dilema |
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O percurso que eu fiz |
O caminho para "casa" |
Vista à chegada a Oropesa |
Publicado em 23/07/2021 às 0:07
Temas: bikepacking viagem
Dois ursos e uma bicicleta |
Puerta del Sol |
Calle Preciados |
E uma estátua de corvos em Lisboa? |
A velha Madrid |
O céu limpo deu lugar a nuvens sinistras |
Para Norte! |
Percebem? |
A coisa promete! |
Na paragem do BUS |
Dia 7. Madrid-Manzanares el Real. 49km. (Estrada/Ciclovia)
Publicado em 19/07/2021 às 1:10
Temas: bikepacking viagem
Caramelos? |
Na berma da via rápida em obras |
Rumo a Madrid! |
Ciclovias de luxo |
Madrid?? |
Hum... |
Sim, é uma lixeira numa estrada abandonada |
Madrid! |
Vista de quarto |
Bicicleta no quarto #4 |
Publicado em 18/07/2021 às 20:49
Temas: bikepacking viagem
What? Nunca comeram feijoada na cama? |
Não chego a articular a minha resposta, que antevejo ser hilariante e charmosa, pois há um crescente som irritante que monopoliza a minha atenção. Não percebo de onde vem, mas parece conhecido... Instintivamente, silencio o alarme do telemóvel e levo alguns segundos a reconhecer o que me rodeia. São seis da manhã e ainda está escuro lá fora. Acendo a luz e levanto-me a custo da cama. Esforço-me por recordar que estou numa casa rural em Oropesa, uma pequena terra da província de Toledo, bem no meio do Grande Deserto Espanhol.
Arrasto-me para o WC, mas as pernas pesam-me como dois marcos dos descobrimentos, e tenho o equilíbrio de um marujo bêbado recém regressado da carreira da India. Tenho muita sede, embora me lembre de me ter hidratado bem a noite anterior. Lavo os dentes e constato que, de alguma forma, tenho a boca cheia de sangue seco. A próxima etapa da minha higiene matinal não é mais animadora: pelo quarto dia consecutivo, a minha urina é da cor de Earl Grey. Saio da casa de banho a murmurar alguma coisa sobre "isso não deve ser bom". Ao lado da janela aberta, repousa o Dentuça. O seu olhar parece questionar: "O que é que estamos a fazer?"
#3 Bicicleta cá dentro |
Habitual reabastecimento num posto de combustível |
Sombras e bancos! Foi a única vez que vi tal coisa! |
Mais um dia no deserto |